Gestão Territorial no Brasil: um corpo sem cabeça
- AnáliseGeo

- 30 de set.
- 3 min de leitura
A gestão do território nacional é um dos maiores desafios do Estado brasileiro. O país possui uma vasta extensão territorial, com realidades diversas e sobreposições de interesses. No entanto, o que deveria ser conduzido por um sistema coeso e estratégico, capaz de organizar as múltiplas demandas, acaba operando de forma fragmentada. Hoje, a estrutura se assemelha a um corpo sem cabeça: há órgãos que atuam como braços, pernas e órgãos vitais, mas falta a direção central, o cérebro capaz de coordenar as ações.

Um mosaico desarticulado
A atuação é pulverizada entre diferentes instituições:
Incra: responsável por projetos de assentamentos, territórios quilombolas, estrutura fundiária e certificação de imóveis rurais.
ICMBio: gestor das unidades de conservação federais.
Funai: voltada à proteção e demarcação de terras indígenas.
SPU: administradora das terras públicas federais.
Receita Federal: com funções cadastrais e fiscais que impactam diretamente a governança do solo.
Órgãos Estaduais de Terra: que lidam com áreas devolutas e programas regionais de regularização.
Prefeituras: gestoras do solo urbano, zoneamento e arrecadação imobiliária.

Cada um desses atores desempenha papéis importantes, mas a ausência de um centro coordenador transforma o processo em um conjunto de ações isoladas, frequentemente sobrepostas ou até contraditórias.
O corpo sem cérebro
A metáfora do corpo sem cabeça traduz a realidade brasileira: braços que se movem em direções opostas, pernas que não caminham no mesmo ritmo e órgãos que não comunicam entre si. Assim, em vez de se constituir como um sistema inteligente, a gestão do território nacional se perde em conflitos institucionais, insegurança jurídica e desperdício de recursos públicos.
Exemplos abundam: assentamentos rurais sobrepostos a terras indígenas; unidades de conservação que avançam sobre propriedades privadas já certificadas; áreas da União ocupadas irregularmente sem definição clara de competências. Cada conflito desse tipo gera processos administrativos, ações judiciais, tensão social e prejuízos que poderiam ser evitados.
A necessidade de uma instância central
Para que esse corpo passe a ter cabeça e cérebro, é fundamental a criação de uma instância estratégica de governança territorial, posicionada acima dos ministérios e abaixo da Presidência da República. Essa estrutura teria funções claras:
Definir diretrizes nacionais de gestão territorial;
Integrar as bases de dados fundiários, ambientais, fiscais e urbanos;
Harmonizar a atuação de órgãos federais, estaduais e municipais;
Reduzir sobreposições e conflitos de competência;
Otimizar o uso dos recursos públicos e promover políticas territoriais inteligentes.

Rumo a uma política nacional de gestão do território
Essa transformação não se resume à criação de um novo órgão. É necessário instituir:
Uma Política Nacional de Gestão Territorial (PNGT), com princípios e metas comuns.
Um Sistema Nacional de Gestão Territorial (SNGT), que unifique as informações cadastrais e permita atuação coordenada.
Um conselho estratégico interministerial, com poder vinculante, capaz de orientar e monitorar ações.
Com esses pilares, o Brasil poderá transformar sua gestão territorial de uma soma de iniciativas isoladas em uma política de Estado, que garanta segurança jurídica, sustentabilidade ambiental e desenvolvimento socioeconômico equilibrado.
Conclusão
Enquanto persistir a atuação fragmentada, o país continuará a operar como um corpo sem cérebro, incapaz de alinhar suas forças em uma direção comum. A criação de uma instância central de governança territorial não é apenas uma opção administrativa: é uma condição estratégica para que o território brasileiro seja gerido de forma inteligente, eficiente e justa.



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