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A integração no cadastro dos imóveis rurais vai facilitar a vida do contribuinte e evitar fraudes

A zona rural possui atualmente dois tipos de cadastros para as propriedades, o que dificulta a fiscalização e favorece as fraudes e o uso inadequado da terra. Uma solução seria a integração desses registros em um único sistema, medida que deve ser tomada em breve pelo governo federal.

Pelo menos é o que espera o chefe do serviço de cartografia do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), o engenheiro cartógrafo Miguel Neto, que também lidera a Divisão de Ordenamento Fundiário da mesma instituição. Na entrevista a seguir, ele fala da integração dos cadastros, da política de assentamento e da situação da Bahia.

Revista do CREA/BA numero 48, em 2015. Páginas 32-35.

Quais as atribuições de seu setor?

O serviço de cartografia atua diretamente nos serviços de georreferenciamento dos projetos de assentamento e territórios quilombolas. É responsável também pela organização do comitê regional de certificação e dá suporte à fiscalização dos serviços contratados pelo Incra, no que diz respeito ao georreferenciamento e ao parcelamento de imóveis rurais e regularização fundiária executadas na Bahia.

Por que é importante unificar os cadastros de imóveis rurais?

Atualmente, existe o Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR), emitido pelo Incra, e o ITR, da Receita Federal. A ideia é que a partir de 2016 se faça apenas uma declaração, o que vai facilitar a vida do contribuinte e evitar fraudes, negligências, omissões, evasão de divisas e sonegação fiscal. Mas já tivemos alguns avanços, como a recente modernização do cadastro de imóveis rurais, o que está permitindo um cruzamento de dados gráficos oriundos das certificações do georreferenciamento com o cadastro declarado pelos proprietários, o que melhora muito a análise por parte dos técnicos do Incra. A CCIR é exigida de três em três anos e o ITR anualmente. Com a integração, seria necessário apenas um documento anual. Vale lembrar que a cobrança vai continuar sendo feita pela Receita, só a entrada de informações que será única. Além disso, buscamos também a integração com o cadastro ambiental do Governo do Estado. Já houve uma primeira conversa com o Inema (Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos) para que o órgão estadual forneça os dados para um cruzamento de informações. Já estamos, inclusive, criando um termo de cooperação entre os dois órgãos.

Como é executado esse serviço na Bahia?

Enfrentamos hoje uma grande dificuldade de mão de obra para atender à demanda. Por isso o Incra tem firmado acordos de cooperação técnica com as prefeituras, nos quais montamos a estrutura nas cidades e capacitamos os funcionários municipais para que eles executem esse cadastro.

Esse cadastro é feito de que forma?

O proprietário procura o órgão em sua cidade e faz a declaração. Com a modernização, ampliamos essa rede de atendimento também pela internet. Ele cadastra o imóvel na web e envia os documentos pelo correio. Nesse cadastro são informados os dados do proprietário, do imóvel e o uso que se faz dele. De posse dessas informações, temos como saber se a propriedade atinge o índice de produtividade, que é o grau de eficiência e utilização da terra. Assim ficamos sabendo se ela está cumprindo sua função social. Ao final, definimos se o imóvel é produtivo ou não. Vale lembrar que os bancos exigem esse documento. Primeiro por conta da veracidade da informação sobre as propriedades que eles vão dar garantia e crédito. Depois, porque eles vão poder avaliar o potencial agrícola e o retorno que aquela terra pode dar.

Então esse documento é essencial para quem busca financiamento?

Com certeza. Além da certificação, que é a garantia da existência da terra, o CCIR é um dos documentos principais, não só para o banco, como para a segurança jurídica do proprietário. Sem esse documento, ele não consegue, por exemplo, registrar o imóvel no cartório.

Mas se o imóvel é particular, porque ele precisa ter um uso social?

Do ponto de vista tributário, se o imóvel não cumpre a função social, se é improdutivo, o imposto cobrado pela Receita Federal vai crescendo gradativamente. Podemos fazer uma analogia com o IPTU. Se um terreno está abandonado por muito tempo e a prefeitura entende isso como especulação imobiliária, a taxa do imposto que incide sobre ele é maior do que um que está sendo utilizado para moradia. Do ponto de vista agrário, esse imóvel improdutivo é passível de desapropriação para fins de reforma agrária. Por isso é importante que o produtor mantenha esses dados atualizados para não ficar sujeito nem à cobrança maior de impostos e nem à desapropriação.

Infográfico - Revista do CREA/BA

Como funciona o processo de desapropriação? Antes de explicar, quero deixar claro que se o produtor estiver regularizado e sua terra for produtiva, ele pode ficar tranquilo que o processo não vai atingi-lo. Uma ação de desapropriação começa com o imóvel rural sendo reivindicado pelos movimentos sociais. O Incra então providencia uma pré-avaliação para saber se ele está apto para tal fim. Identificada essa possibilidade, o proprietário é notificado e uma vistoria é realizada, seguida de um laudo agronômico com os limites e usos desse imóvel. Se for constatada a improdutividade, a terra é desapropriada e é feita uma avaliação pelos valores de mercado. Se o proprietário aceitar de imediato a avaliação, o trâmite para a liberação dos recursos inicia em até cinco anos, mas se ele não aceitar e entrar na Justiça, o prazo é indeterminado.

A Bahia tem muitos imóveis desapropriados para Reforma Agrária? Hoje temos mais de 500 assentamentos. Um estado com a nossa dimensão não poderia ser diferente. A perspectiva para 2016 é fazer muitas desapropriações, a partir de acordos, sobretudo no extremo sul, com as empresas de celulose, que têm ofertado algumas áreas para os movimentos sociais.

Qual o suporte que o Incra dá às famílias? Antes mesmo de as famílias ocuparem o assentamento, o Incra dá apoio para deslocamento e alimentação. E na desapropriação elas recebem crédito de apoio imediato para o custeio das necessidades básicas. Ao longo do processo de implantação dos assentamentos, essas famílias são beneficiadas pelos diversos programas do governo, como o “Bolsa Família” e o “Minha Casa, Minha Vida”.

Como é feita a distribuição desses lotes? Já no ato de criação do assentamento, nós determinamos como será a distribuição espacial, definindo as áreas para plantio e espaços coletivos, o que evita conflitos. Isso é estabelecido em conjunto com as próprias associações.

E a situação jurídica desse imóvel? O assentado pode vender? Inicialmente a propriedade fica em nome do Incra e só a partir do processo de titulação e do cumprimento de cláusulas resolutivas é que é possível passá-la juridicamente para o nome do assentado. Isso leva cerca de dez anos. É o tempo também para quitação de débitos que ele venha a adquirir com o governo federal.

Quantos imóveis rurais existem na Bahia? São cerca de 570 mil, incluindo os registrados em cartório e os que estão na condição de posse. Vale lembrar que para ser considerado rural ele deve ter uma destinação agroextrativista, agroindustrial ou voltado para a pecuária, mesmo que esteja em uma zona urbana.

Existem muitas propriedades irregulares no Estado? Infelizmente ainda existem muitas posses, que são aquelas propriedades sem matrícula, e consequentemente sem segurança jurídica. Esses proprietários ficam impedidos de participar de políticas do governo e de acessar crédito. Essa situação é mais grave na região do semiárido, que tem uma condição climática desfavorável, falta de acesso a crédito e uma população desassistida por muitos anos. Estamos fazendo um trabalho para retomar a regularização e já começamos em Monte Santo, Cícero Dantas, Fátima, Ribeira do Pombal e outros municípios da região.

Existem regiões com mais desapropriações do que outras na Bahia? É bem homogêneo, com exceção da região oeste, que não tem tanta desapropriação, porque lá existe uma concentração forte de agronegócio e as condições de projetos agrícolas para esse tipo de negócio em reforma agrária são muitos onerosos.

Os projetos envolvendo a agricultura familiar têm algum diferencial para efeito de Reforma Agrária? De uma maneira geral, sim. Seguimos as determinações do MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário) ao qual o Incra é submetido. Existe a prerrogativa de fortalecimento da agricultura familiar em todo o Brasil e na Bahia isso vem sendo intensificado este ano. A Secretaria do Desenvolvimento Rural também recebe recursos do MDA para aplicação dessas políticas. Hoje temos um convênio de assistência técnica que pactua com os assentamentos quais as soluções de produção, que geralmente são voltadas para a agricultura familiar, incluindo a produção de mel, farinha de mandioca, caprinocultura, feijão, milho e mais uma série de produtos.

Entrevista publicada originalmente na Revista do CREA/Bahia edição 48, páginas 32 a 35, em 2015.

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Por Miguel Neto

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